STJ

NEPOTISMO – MORALIDADE
Recurso em MS 15.316/SP, in DJe 30.09.2009
Rel. Min. Herman Benjamin

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. NEPOTISMO. PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. INEXISTÊNCIA. MANUTENÇÃO DA PENA DE CENSURA APLICADA A JUIZ DE DIREITO POR NOMEAR O PAI DE SUA COMPANHEIRA PARA O MÚNUS DE PERITO. ART. 41 DA LOMAN. ART. 125, I E III DO CPC.

COMENTÁRIOS:

Trata-se de caso em que o juiz de Direito impetrou mandado de segurança objetivando invalidar pena de censura aplicada pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, em função de ter nomeado o pai de sua companheira para oficiar em perícias médicas em processos de sua responsabilidade, na Vara em que é titular.
Diante da alegação de (1) violação à Loman, (2) à ampla defesa e (3) à independência dos juízes, assim se manifestou o STJ:

(1) É certo que o art. 41 da Loman dispõe que o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelo teor das decisões que proferir, “mas implícita nesta norma está a exigência de que essas mesmas decisões não infrinjam os valores primordiais da ordem jurídica e os deveres de conduta impostos ao juiz como desiderato de assegurar a sua imparcialidade”. “A Loman não se presta a acobertar, legitimar ou proteger atos judiciais que violem o princípio da moralidade administrativa, o princípio da impessoalidade ou as regras de boa conduta que se esperam do juiz”.

(2) Ademais, quanto à censura, a decisão do STJ determinou que: “a sindicância administrativa prescinde de observância ampla dos princípios do contraditório e da ampla defesa, por se tratar de procedimento inquisitorial, anterior e preparatório à acusaão e ao processo administrativo disciplinar, ainda sem a presença obrigatória do investigado. Inexiste nulidade sem prejuízo. Se é assim no processo penal, com maior razão no âmbito administrativo. Na arguição de nulidade, a parte deve indicar claramente o prejuízo que sofreu, bem como a vinculação entre o ato ou omissão impugnados e a ofensa à apuração da verdade subatancial, daí decorrento inequívoco reflexo na decisão da causa.

(3) Quanto à questão da independência funcional, determinou a decisão que: “A independência dos juízes não pode transmudar-se em privilégio para a prática de atos imorais. A garantia é conferida ao Poder Judiciário como instituição, em favor da coletividade, e deve ser por ele mesmo fiscalizada”.

Por fim, explicitou-se que: “o nepotismo e compadrio são práticas violadoras dos mais comezinhos fundamentos do Estado Democrático de Direito e, por isso mesmo, exigíveis não só do Executivo e Legislativo, mas, com maior razão, também do Judiciário. É aberrante a nomeação, pelo juiz, de parente, cônjuge, consaguíneo ou afim, bem como de amigo íntimo, como perito do juízo, comportamento esse que macula a imagem do Poder Judiciário, corrói a credibilidade social e viola frontalmente os deveres de ‘assegurar às partes igualdade de tratamento’ e ‘previnir e reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça”. Nos termos da Constituição Federal, a união estável e reconhecida como unidade familiar, de acordo com o art. 226, § 3.

Observações (de Irene Patrícia Nohara): Irrepreensível a decisão, haja vista a leveza da sanção aplicada, de mera censura. Causa estranheza inclusive o fato de o juiz ter entrado com o mandado de segurança para tentar invalidar a pena de censura… A única questão que, ao nosso ver, poderia ser (tecnicamente) alegada é justamente esta de ausência de contraditório e ampla defesa na sindicância, pois há de fato corrente no sentido de que a sindicância inquisitorial só seria voltada para atividades meramente investigativas e preparatórias do processo administrativo disciplinar, não para as punitivas (Cf. NOHARA, Irene Patrícia. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2011. p. 290-291), mesmo que com sanção branda, ou seja, que haveria a possibilidade de sindicância contraditória. Mas isto é, na prática, querer se utilizar de formalismo excessivo para tentar “apagar as marcas” de um erro gravíssimo, o que não é compatível com o espírito do processo administrativo, orientado para oformalismo mitigado/moderado. Portanto, corretíssima a alusão do STJ no sentido de que não há nulidade sem prejuízo (pas de nullité sans grief), pois não se pode esquecer que o processo administrativo disciplinar se direciona para a verdade material! Concordamos com o veredito do STJ no sentido de advertir a todos, por meio da presente decisão, que é aberrante a nomeação pelo juiz do perito pai de sua companheira, pois a união estável é considerada, pela Constituição, como entidade familiar. Quanto à questão do fato de ser companheira, deve-se lembrar (como um parâmetro possível de se resgatar), que a Resolução do CNJ 7 veda o nepotismo no Poder Judiciário, nas nomeações de cargo em comissão, função gratificada ou atividade por tempo determinado, por cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau.

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