Principais medidas da Lei 13.979/2020 de enfrentamento do coronavírus
16.03.2020 por Irene Nohara1329 acessos
O Coronavirus já foi categorizado como pandemia pela OMS. O Brasil não fez parte dos epicentros iniciais de disseminação da doença e de seu contágio, mas não está livre de sofrer seus efeitos mais devastadores também. O percentual de letalidade do coronavirus não é alto, mas, se a população infectada for, em números absolutos, imensa, então haverá mortes proporcionalmente em contingentes populacionais grandes, caso a velocidade de contágio não seja contida.
Assim, muitos governos se esforçam para contenção da pandemia em sua expansão geográfica, contando o relógio para que a ciência avance rapidamente em descobertas de vacina e tratamento adequado, sendo imprescindível que os governos tomem medidas aptas conter a expansão do contágio para que o sistema de saúde dê conta de atender a demanda crescente que se anuncia, momento em que o SUS se mostra como exemplo, sendo importante haver uma gestão pública eficaz e concertada entre órgãos e governos, Poder Público e iniciativa privada, para conter os riscos da pandemia.
Por conta do coronavírus, houve a edição a Lei nº 13.979/2020, que prevê medidas de enfrentamento da saúde pública para proteção da sociedade da disseminação e seu contágio. As medidas devem ser acionadas em função de evidências científicas e análises estratégicas no período de tempo ou no espaço necessário à promoção e preservação da saúde.
São medidas dispostas na Lei nº 13.979/2020: o isolamento e a quarentena, sendo que a diferença básica entre elas é que enquanto o isolamento envolve a separação de pessoas doentes ou contaminadas, recaindo também sobre bagagens, meios de transporte, mercadorias e encomendas postais, para evitar a contaminação ou a propagação, a quarentena recai sobre restrições de atividades ou separação de pessoas apenas suspeitas de contaminação, também recaindo sobre bagagens, meios de transporte, mercadorias e encomendas postais. As duas medidas devem ser produto de ato do Ministro da Saúde ou de autorização deste para Gestores Locais de Saúde, conforme condições e prazos delimitados.
Os gestores locais de saúde podem adotar diretamente as seguintes medidas: (a) determinação compulsória de: exames médicos, testes laboratoriais, coleta de amostras clínicas, vacinação e outras medidas profiláticas, ou tratamentos médicos específicos; (b) estudo ou investigação epidemiológica; e (c) requisições de bens e serviços.
A requisição de bens e serviços é um instituto clássico do Direito Administrativo, sendo que a lei estabelece que será garantido o pagamento de posterior indenização justa para o particular que tiver seus bens requisitados nestas condições. A requisição é importante caso o SUS não dê conta de atender o aumento exponencial de casos de pessoas doentes, hipótese em que poderá requisitar espaços particulares para os fins da lei.
Também são medidas previstas na lei: exumação, necrópsia, cremação e manejo de cadáveres, sendo medidas importantes para que haja um protocolo de manejo do corpo, evitando-se, assim, contaminações.
Uma medida que afeta a livre circulação, mas que está prevista, é a restrição excepcional e temporária à entrada e saída do País, por rodovias, portos e aeroportos. Para que haja a edição dessa medida, faz-se necessário: (1) recomendação técnica da ANVISA; e (2) ato conjunto do Ministro do Estado com o Ministro da Justiça e da Segurança Pública.
Outra medida fundamental que pode vir a ser muito útil é a autorização excepcional e temporária para importação de produtos sem registro da Anvisa, desde que: seja produtos registrados por autoridade sanitária estrangeira e houver previsão por ato do Ministério da Saúde.
Trata-se de previsão relevante, dado que nesse estágio de proliferação da doença o mundo inteiro está sintonizado com laboratórios e institutos de pesquisa em busca de uma vacina ou medida profilática e um tratamento eficaz e customizado ao coronavírus (Covid-19), então, mesmo que houvesse essa relevante descoberta científica, seria importante que o nosso País pudesse importar o produto sem esperar pela burocracia de um registro interno pela Anvisa, devido a situação de emergência derivada da pandemia.
São direitos das pessoas afetadas pela aplicação da lei: serem informadas permanentemente sobre seu estado de saúde e assistência à família; receberem tratamento gratuito, o que é uma característica do nosso sistema de saúde, conforme o SUS, sendo que até governantes de centro-direita no mundo, como o Presidente da França, Macron, percebem, ao ensejo da pandemia, o quanto a saúde pública é um bem precioso, a ser especialmente protegido pelo Estado; sendo também prevista na lei a necessidade de respeito à dignidade humana, aos direitos humanos e às liberdades fundamentais.
Por fim, a lei estabelece dispensa de licitação para bens, serviços, insumos de saúde adquiridos para o enfrentamento da emergência do coronavírus. Não há como mensurar precisamente o impacto, mas o sistema de saúde já deve estar preparado para as contratações diretas, tendo em vista a potencialidade do incremento do seu uso.
Estabelece a lei que as contratações diretas serão disponibilizadas no site oficial, sendo importante para assegurar a transparência e o maior controle social, dado que terão dados dos contratos celebrados, com a inscrição na receita do contratado, o prazo e o valor firmado.
Por fim, importante que haja uma concertação interorgânica e interfederativa, no compartilhamento de dados e estratégicas, sendo também importante a colaboração da sociedade e da iniciativa privada, numa governança de riscos. Somente com essa mobilização macro eficaz há a possibilidade de o Brasil evitar os piores efeitos da pandemia, reduzindo o número de mortes e primando pela preservação da saúde pública.
Irene Nohara
Advogada parecerista. Livre-docente em Direito Administrativo (USP/2012), Doutora em Direito do Estado (USP/2006), Mestre em Direito do Estado (USP/2002) e graduação pela USP, com foco na área de direito público. Professora da pós-graduação stricto sensu da Universidade Presbiteriana Mackenzie (mestrado e doutorado). Autora de diversas obras jurídicas.