contratos administrativos

Compartilho aqui o roteiro de perguntas respondidas por escrito por mim, com base na entrevista que foi concedida para o programa Entender Direito, em que Thiago Gomide e Fátima Uchôa entrevistam Maria Sylvia Zanella Di Pietro e Irene Nohara em perguntas práticas em matéria de contratos administrativos. Também poderá ter acesso ao vídeo na íntegra clicando aqui (canal do Youtube do STJ).

1 - O que um contrato tem de ter para ser considerado um contrato administrativo? O que diferencia estes daqueles contratos em geral previstos no Código Civil?

Irene Nohara: Os contratos administrativos são submetidos a regime próprio: regime de direito público, que os diferencia dos contratos de direito privado, disciplinados pelo direito civil. Assim, a presença da Administração Pública, a busca do interesse público, com possibilidade do manejo de cláusulas exorbitantes, com base no ius variandi, são características que diferenciam o contrato administrativo do contrato de direito comum. Assim, basicamente há a presença de cláusulas exorbitantes, que estão fora da órbita dos contratos regidos integralmente pelo Código Civil.

2 – Qual a finalidade desse tipo de contrato?

Irene Nohara: Em sentido genérico, todo contrato administrativo objetiva atingir interesse público primário, isto é, o interesse da sociedade. Todos os institutos do Direito Administrativo sempre têm esse escopo… Mas, em sentido específico, há vários contratos com diversas finalidades: para construção de obras, prestação de serviços, para compras de produtos e vendas/alienações do  Poder Público, a depender o objeto do contrato.  

O Estado é o maior comprador, isso no mundo todo. Imagine, então, o Brasil… com União, 26 Estados Membros, DF e 5.570 Municípios precisando contratar… É um universo enorme… mais de 10% do PIB Nacional (mais de 600 bilhões anuais)…

São as mais variadas finalidades, havendo fornecedores que se especializaram em fornecer ao Poder Público via contrato administrativo.

3 – Qual a diferença de licitação e contrato?

Irene Nohara: Licitação é o processo administrativo que antecede à celebração do contrato, para garantir igualdade, abrir a todos os que queiram a oportunidade de contratar com a Administração (hoje mira INOVAÇÃO e desenvolvimento nacional sustentável – art. 11).

Nem todo contrato é antecedido por licitação, pois pode haver hipóteses de contratação direta previstas na legislação. Assim, apesar da vinculação ainda assim há diferenças entre o instituto da licitação e o do contrato, sendo a licitação um processo e o contrato o escopo mirado pela licitação, mas a licitação, nos dias atuais, tem também objetivos metacontratuais de promoção do desenvolvimento nacional sustentável.

4 – Quem assina os contratos administrativos?

Irene Nohara: Do lado da Administração – o ordenador da despesa do contrato que tenha a competência para firmar o contrato em nome da pessoa jurídica. Do lado do particular: o representante da empresa contratada.

5 – Quem assina os contratos administrativos também pode responder por eventuais irregularidades deste acordo? Que penalidades são previstas?

Irene Nohara: Exato, por isso que muitos agentes públicos procuram se escusar de assinar diretamente contratos administrativos.

O Brasil é um país de extremos, ora há a lacuna e omissão no controle, ora há o excesso do controle,  sendo, em muitos casos, que se vivencia um fenômeno do excesso na responsabilização dos agentes públicos, nem sempre considerando a proibição do bis in idem, pois sobre um mesmo fato há a potencialidade de recaírem inúmeras responsabilidades, com sobreposição, ainda, de distintos órgãos de controle.

Nesta perspectiva, quem assina o contrato administrativo pode por um ato ser submetido a responsabilidade administrativa, civil, criminal e por improbidade… A responsabilidade é subjetiva e não objetiva por parte do agente, mas ele pode responder por improbidade, se houver algum ato ímprobo veiculado no contrato e agir com dolo. Há vários ilícitos que devem ser cometidos, sendo importante para a responsabilidade, agora com o sistema da LINDB que haja dolo ou erro grosseiro, e, no caso da improbidade, o dolo (conforme a Reforma da Lei nº 14.230/2021).

Assim, há perigos e riscos para o agente, o que deriva do fenômeno apelidado de Administração do Medo, o que provoca o “apagão de canetas”. São muitas penalidades previstas em diversas leis, ainda submetidas a controles de diversos órgãos públicos, os quais nem sempre atuam de forma harmônica em relação à interpretação dada a esse emaranhado normativo que rege o sistema de responsabilização dos agentes públicos por atos no desempenho da função pública.

6 – As normas dos contratos em  geral de direito privado são aplicáveis aos contratos administrativos?

Irene Nohara: As normas da Teoria Geral do Direito dos contratos são, mas, no tocante às normas privadas, há algumas ressalvas (sobretudo doutrinárias). Por exemplo, no caso dos contratos celebrados por estatais, são aplicadas, segundo enunciado do CNJ com o STJ: normas de direito privado em contratos administrativos.

No geral, há ajustes de aplicação, conforme o contrato for mais público, celebrado por entidade da Administração Direta, autarquia – será mais submetido a um regime publicístico. Também há o julgado do STJ, RESP 737741, que reconhece a aplicação supletiva de direito privado, não obstante a característica de exorbitância da qual emerge essa supremacia na fixação das cláusulas em função do interesse público.

7 – Qual ou quais características diferem um contrato administrativo de um contrato privado?

Irene Nohara: São, conforme dito, as cláusulas exorbitantes, que permitem a alteração unilateral do contrato, desde que nos percentuais admitidos por lei, rescisão unilateral, fiscalização, imposição de sanção e também ocupação provisória. São cláusulas não encontráveis em contratos de direito privado, por isso saem de sua órbita tendo em vista uma possibilidade de instabilização, desde que nos limites legais, para melhor atingimento do interesse público (primário).

8 – Há diferença entre os contratos administrativos e os contratos da Administração?

Irene Nohara: Essa distinção foi muito bem desenvolvida pela prof. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, pois enquanto os contatos administrativos se submetem integralmente ao regime jurídico de direito público, há contratos que são celebrados pela Administração que se submetem ao regime do direito privado.

9 – Os contratos previstos na Lei de Licitações e Contratos são diferentes dos contratos administrativos previstos na Lei nº 8.987/95 (que trata de concessões e permissões de serviços públicos)

Irene Nohara: Sim, a lei geral de licitações e contratos é atualmente a Lei 14.133/2021, que substituirá totalmente o uso das leis 8.666/93, a lei do pregão e a lei do RDC a partir de abril de 2023. Esta é aplicável para licitações e contratos mais gerais da Administração.

No entanto, se o objeto do contrato for a delegação de serviços públicos, daí, por conta do art. 175 da Constituição, se aplica a lei de concessões e permissões de serviços públicos, que, atualmente, é a Lei 8.987/95. Há muitas diferenças, então, em relação ao objeto, à principiologia (quando se trata de serviços públicos), encampação, caducidade, intervenção nos serviços…

Mas o Judiciário aplica a Lei Geral de Licitações e Contratos de forma subsidiária à Lei de Concessões de Serviços Públicos, possibilidade expressa no art. 186 da Lei nº 14.133/2021: “aplicam-se as disposições desta lei subsidiariamente à Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, à Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004 (sobre Parcerias Público-Privadas), e à Lei nº 12.232/2010, que rege as licitações de serviços de publicidade.

10 – Quais foram as grandes mudanças para os contratos administrativos trazidas pela nova Lei nº 14.133/2021 (a chamada Lei de Licitações e Contratos Administrativos) em relação à antiga Lei nº 8.666/93?

Irene Nohara: Foram muitas mudanças. Primeiramente, a consolidação dos contratos digitais: com o Portal Nacional de Compras Públicas, os catálogos eletrônicos… Depois, o que provoca ainda muito debate foi a previsão do seguro-garantia com cláusula de retomada, com acréscimo do valor para 30% do contrato, assim, em caso de inadimplemento a seguradora assume o ônus de finalizar a obra, o que certamente fará com subcontratação ou, se optar por não a terminar, terá de pagar o valor da apólice. Nos prazos, houve a extensão por até dez anos em contratos de fornecimentos contínuos, uma grande mudança. Já há previsão expressa de matriz de riscos em modelagens contratuais, o que auxiliará na melhor repartição de responsabilidades. Também há previsão de exigências e estímulo ao compliance nas contratações públicos, sendo o programa de integridade obrigatório para contratações de grande vulto. Ressalte-se que o art. 182 da Nova Lei de Licitações e Contratos (Lei nº 14.133/2021) estabelece que o Poder Executivo atualizará os valores a cada 1º de janeiro, conforme índice do IPCA-E, o que já ocorreu para 2022, em que houve a atualização em 8,04%, assim, não se trata de valor fixo… Por exemplo, a contratação de grande vulto, que era de 200 milhões de reais, foi, em 2022, para R$ 216.081.640,00.

11 – Quanto a essa antiga e a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, como se dá a aplicabilidade por parte da Administração Pública? Ambas as legislações continuam a direcionar os contratos ou a 8.666 já foi revogada?

Irene Nohara: Há a aplicabilidade concomitante de todos os diplomas até abril de 2023, depois, terá só a 14.133/2021. De acordo com o art. 194 da Lei nº 14.133/2021, esta lei entrou em vigor na data da publicação, em abril de 2021, mas as Leis 8.666/93 (Lei Geral), 10.520/2002 (Lei do Pregão) e 12.462/2011 (Lei do RDC), serão revogadas após dois anos da publicação oficial da lei, ou seja, a partir de abril de 2023. Note-se que se a Lei 8.666/93 for aplicada durante esse tempo que antecede sua formal revogação, os contratos serão por ela regidos depois da revogação. Contudo, as novas licitações somente poderão ser regidas pela Lei 14.133/2021 a partir de abril de 2023.

12 – Quando a Lei 8.666 será de fato revogada e, assim, passará a valer apenas a Nova Lei 14.133?

Irene Nohara: Conforme dito, a Lei nº 8.666/93 será revogada a partir de abril de 2023, contudo, quando as novas licitações somente serão regidas pela Lei nº 14.133/2021. Mas não poderemos ‘enterrar’ prematuramente a Lei 8.666 (esta com esse número horripiliante – rs, já reputada walking dead), pois pode ser que alguma licitação regida por ela feita neste período de 2021 e 2023 continue a ser disciplinada na contratação celebrada antes de sua revogação formal, por isso que se critica tanto essa sistemática de entrada em vigor sem revogação dos diplomas anteriores. Acredito que o legislador quis criar uma espécie de test drive na nova lei, já abrindo possibilidade de sua utilização enquanto ainda não revogadas as leis anteriores.

13 – Em que casos a Administração Pública pode celebrar contratos administrativos sem prévio procedimento licitatório?

Irene Nohara: Nos casos de dispensa e inexigibilidade. A inexigibilidade é para situações em que a licitação é inviável… em cinco hipóteses, que agora contemplam também: credenciamento e locação/aquisição de imóvel que atenda (além de fornecedor exclusivo, serviços técnicos com profissional especializado e contratação do setor artístico), de acordo com o art. 74 da Lei. Já a dispensa contempla casos em que há veiculação de políticas públicas específicas, conforme os casos disciplinados agora no art. 75 da lei, sendo importante lembrar que os valores de contratação direta foram ampliados para: 50 mil para serviços e compras (agora, com atualização do IPCA: 54.020,00, e 100 mil para obras e serviços de engenharia e serviços automotores, sendo este valor agora em torno de 108.040,00). Também tem as hipóteses em  razão do objeto, em se tratar de urgência e pela pessoa.

14 – O que significa dizer que os contratos administrativos são por adesão?

Irene Nohara: Significa que as cláusulas já são preestabelecidas pela Administração, sem a possibilidade de negociações/alterações. Os contratos de adesão são a realidade na sociedade de massas e no caso da Administração Pública há a busca pelo interesse público como objeto, não submetido integralmente à avença, exceto no caso das cláusulas econômico-financeiras. Então, a minuta do contrato vem no anexo do edital de licitação. Importante que o licitante que queira celebrar o contrato saiba de sua conformação antes de entrar numa licitação.

15 – As leis que regulam contratos administrativos o fazem para todos os entes federativos?

Irene Nohara: Sim, a lei geral de licitações e contratos é aplicável a todos os entes federativos: União, Estados, Distrito Federal e Municípios. A Constituição no art. 22, XXVII, determina que compete privativamente à União legislar sobre normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais de todos os entes federativos. No caso de empresas públicas e sociedades de economia mista, aplica-se, no entanto, a disciplina regida pela Lei nº 13.303/2016. Ainda, a lei geral (antes a Lei 8.666/93, agora a Lei 14.133/2021) só deveria disciplinar regras mais gerais, o que significa que os entes podem criar legislações para estabelecer normas específicas sobre o tema, para adequá-lo às suas particularidades, desde que sigam parâmetros da lei geral.

16 – São cabíveis alterações unilaterais do contrato por parte da Administração Pública. Quais cuidados devem ser observados nesse tipo de alteração?

Irene Nohara: Sim, faz parte das chamadas cláusulas exorbitantes a possibilidade de a Administração Pública alterar unilateralmente o contrato. Como cuidado, a Administração deve observar, no entanto, os limites de alteração admitidos na legislação, que são, no teor quantitativo: acréscimos ou supressões até 25% em contratos no geral, sendo de até 50% de acréscimo no caso de reforma de obras e de edifício ou equipamento, pois a experiência demonstra que reforma sempre sai mais cara, nunca mais barata…

Também deve resguardar o equilíbrio econômico-financeiro ao fazer alterações, pois as cláusulas econômico-financeiras são intangíveis/imutáveis sem autorização do particular, sendo então que cada aumento de exigência deve ser acompanhado da correspondente contraprestação a ser paga pelo Poder Público.

17 – É necessário contraditório prévio no caso de intervenção em contrato de concessão com concessionária de serviço público?

Irene Nohara: Essa é uma questão polêmica, mas temos de ressaltar que a segunda turma do STJ se manifestou, em março deste ano (de 2022), que não há a necessidade do contraditório prévio à decretação da intervenção, enquanto ato administrativo, nos contratos de concessão de serviços públicos, sendo que, após a instauração da intervenção, enquanto um procedimento administrativo para apurar as irregularidades que haveria a investigação e também a fiscalização e não a punição a exigir o contraditório, que ocorrerá depois… Não sendo a decretação um ato punitivo propriamente dito.

Porém, eu, data vênia, entendo que a intervenção já é medida que gera muitos ônus e consequências à empresa, tendo de ser sopesada e utilizada só quando houver estrita necessidade, dentro de uma ponderação equilibrada… para evitar desgastes que poderiam ser evitados por outras medidas, como a própria fiscalização efetiva… Então, seria mais favorável à admissão de um contraditório prévio, apesar da orientação mencionada, até porque o art. 33 da Lei nº 8.987/95 efetivamente assegura o direito à ampla defesa (apesar de não deixar claro se o momento seria anterior ou posterior à instauração do processo de intervenção).

18 – O STJ já se posicionou numa demanda em que uma concessionária de rodovia pretendia cobrar valores de uma concessionária de energia pela instalação de postes de passagem de cabos aéreos. Lembra-se deste caso? No contrato administrativo, havia previsão em favor da concessionária da rodovia? Afinal, qual foi o resultado do julgamento?

Irene Nohara: Sim, trata-se do RESP 1677414/SP, de Relatoria da Ministra Regina Helena Costa, em que o STJ considerou ilegal a cobrança pelo uso de solo, subsolo e espaço aéreo: (a) pois a utilização reverte em prol da sociedade, não cabendo fixação de preço público; e (b) não seria também taxa, pois não há serviço público prestado ou poder de polícia exercido.

Note-se que o STF admite tal cobrança se for de utilização da faixa de domínio, isto é, da margem de terra que fica à margem das rodovias, desde que seja feita nos termos do art. 11 da Lei de Concessão, ou seja, com autorização expressa do poder concedente e também previsão contratual.

19 – O contratado pode suspender o cumprimento de suas obrigações se houver atraso superior a 90 dias dos pagamentos devidos pela Administração?

Irene Nohara: Sim, na 8.666/93 se determinava 90 dias, agora este prazo foi reduzido para dois meses (cerca de 60 dias), conforme o art. 137, § 2º, IV, da Lei nº 14.133/2021. O prazo é contado da emissão da nota fiscal, dos pagamentos ou das parcelas devidas.

20 – O reajuste contratual para reposição do valor da moeda pode ser considerado automático? As alegações do Poder Público sobre eventuais descumprimentos podem obstar esse reajuste?

Irene Nohara: Sim, o reajuste deve ser automático, periodicamente realizado pela Administração, de ofício, sem a necessidade de prévio requerimento. Não é correto haver uma associação entre descumprimentos e a ausência de reajuste enquanto suposta sanção… pois uma situação é aquela de se indenizar algo feito pelo particular, outra situação, juridicamente distinta, é o reajuste, que vem a recompor o valor corroído pelas altas de preços… Em minha opinião, os descumprimentos não poderiam obstar o reajuste…

21 – É permitida a submissão de conflitos decorrentes dos contratos administrativos a métodos alternativos?

Irene Nohara: É sim possível, inclusive com a mudança que ocorreu, em 2015, na lei da arbitragem, ficou ainda mais clara essa possibilidade. Houve, na I Jornada de Direito Administrativo do CJF com o STJ enunciado neste sentido. Trata-se do enunciado 10: “em contratos administrativos regidos pela lei de licitações (à época, 2020 – então, a Lei 8.666/93), é facultado à Administração propor aditivo para alterar a cláusula de resolução de conflito entre as partes, incluindo métodos alternativos ao Poder Judiciário como Mediação, Arbitragem e Dispute Board.

Na nova lei, dá-se destaque ao capítulo XII do título III – Dos contratos administrativos, em cujo art. 151 determina que nas contratações regidas por esta lei, poderão ser utilizados meios alternativos de prevenção e resolução de controvérsias, notadamente a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas e a arbitragem.

Note-se que a arbitragem é sempre de direito e observará o princípio da publicidade. Ademais, o art. 153 autoriza que haja aditamento dos contratos para permitir a adoção de meios alternativos de resolução de controvérsias. Como exigência procedimental, exige o art. 154 da Lei que o processo de escolha dos árbitros, dos colegiados arbitrais e dos comitês de resolução de disputas observará critérios isonômicos, técnicos e transparentes.

22 – Quais as controvérsias podem ser resolvidas por essas formas alternativas (mediação e arbitragem?) As relativas ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato integram esse rol de possibilidades?

Irene Nohara: Há muitas vantagens na utilização de formas alternativas, principalmente devido à manutenção dos contratos… Contudo, em primeiro lugar: a arbitragem de contratos administrativos diz respeito a direitos patrimoniais disponíveis. Tal exigência é extraída do § 2º, do art. 1º, da Lei nº 13.129, à Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996), que diz que: “A administração direta ou indireta poderá utilizar-se da arbitragem para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis”. Importante que a cláusula arbitral se refira ao aspecto financeiro.

São exemplos de direitos patrimoniais disponíveis, conforme art. 151, parágrafo único, questões relacionadas a restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, impedimento de obrigações contratuais por quaisquer das partes e cálculo de indenizações.

23 – Os contratos regidos pelas empresas estatais são considerados contratos administrativos?

Irene Nohara: Não exatamente, se por contrato administrativo se entender submissão integral do direito público, pois as estatais são pessoas jurídicas de direito privado, sendo que os seus contratos se regem por lei específica – e a interpretação subsidiária – é do direito privado… para dar mais flexibilidade… A rigor, não se aplica a nova lei subsidiariamente.  

A Lei 14.133/2021 só faz alusão à aplicação subsidiária à Lei de Concessões, à Lei de PPP, à Lei que rege a contratação de serviço de publicidade, mas evidentemente que não à Lei das Estatais. Neste mesmo sentido, há o Enunciado 17 da I Jornada de Direito Administrativo da CJF e STJ, ocorrida em agosto de 2020: “Os contratos celebrados por empresas estatais, regidos pela Lei nº 13.303/2016, não possuem aplicação subsidiária da Lei Geral de Licitações”.

Em casos de lacuna contratual, aplicam-se as disposições daquela Lei e as regras e princípios de direito privado. Na prática, evidentemente que há dificuldades em não estabelecer este diálogo, até porque, para dizer a verdade, as leis são bem parecidas, tiveram a mesma influência: do pregão e do RDC, os mesmos limites de valores em contratações diretas…

24 – O que acontece quando há inadimplemento de encargos trabalhistas de parte do contratado? Há transferência automática destes encargos para a Administração?

Irene Nohara: O Poder Público, conforme o teor da Súmula TST 331, pode vir a ser responsabilização por culpa in vigilando, na hipótese de omissão na fiscalização de pagamento destes encargos ou verbas trabalhistas. Mas essa transferência não é automática de forma alguma, pois tem de se averiguar o grau de culpa e omissão por parte da Administração.

É muito ruim quando a empresa contratada não paga, pois o Estado (e todos nós), tem de pagar duas vezes… ao mesmo tempo também o trabalhador não pode ficar desamparado, por isso que a nova lei é bem rigorosa na exigência de a Administração fiscalizar esses pagamentos por parte da contratada.

A nova lei ressalta essas obrigações no seu art. 50, advertindo que para contratos de regime de dedicação exclusiva de mão de obra, o contratado deverá apresentar, quando solicitado: registro de ponto, recibo de pagamento de todas as verbas (horas extra, repouso remunerado, 13º…), férias, quitação, vale transporte e vale alimentação (na  forma da norma coletiva).

25 – Há indenização ao contratado em caso de declaração de nulidade do contrato por ausência de licitação? Nessa situação, pode haver pedido de reequilíbrio econômico-financeiro de parte do contratante?

Irene Nohara: Ora, se o contratado estava de boa-fé, é vedado o enriquecimento sem causa por parte da Administração, que tem de indenizar pelos serviços prestados. Geralmente, o Poder Público só pode se eximir de pagar e deve pagar de forma equilibrada diante da má-fé do contratado ou quando ele concorre para a nulidade identificada.

26 – Constituição Estadual pode prever prazo para pagamento de indenização em hipótese de encampação de serviços públicos?

Irene Nohara: Na ADI 1746, de relatoria do Min. Marco Aurélio, em 2014, houve estabelecimento, pelo STF, de que o assunto rescisão de contrato administrativo e sua indenização seriam normas gerais, não sendo possível, portanto, à Constituição Estadual dispor diferentemente. Assim, neste julgamento o Ministro Marco Aurélio considerou que “o constituinte estadual legislou em matéria reservada à União”. O Supremo Tribunal Federal tem entendido tratar-se de invasão de competência.

27 – A regularidade fiscal que é exigida para se contratar com a Administração Pública tem de se manter durante toda execução do contrato? O que acontece se a regularidade fiscal não for mantida?

Irene Nohara: Em tese tem sim, mas há momentos de exigência: primeiro, na licitação, depois do julgamento da proposta e para o licitante mais bem classificado (art. 63, III); e antes de formalizar ou prorrogar o prazo de vigência do contrato, conforme art. 91. O Superior Tribunal de Justiça considera que a ausência de  comprovação de regularidade fiscal não autoriza a Administração Pública a proceder à retenção do pagamento pelos serviços comprovadamente prestados, de acordo com o AREsp 275744/BA. Os argumentos relacionam-se com a legalidade e com a proibição de enriquecimento ilícito por parte da Administração Pública.

28 – Em contratos administrativos, é válida a cláusula que prevê a renúncia aos honorários sucumbenciais por parte do advogado?

Irene Nohara: Trata-se de tema polêmico: o Superior Tribunal de Justiça tem decisão, de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, que entende ser válida a cláusula de renúncia aos honorários sucumbenciais de advogado, desde que não contrarie a lei e não seja abusiva.

Em 2009, o Superior Tribunal de Justiça considerou tratar-se de direito disponível e negociável pelo contratante do serviço. Se a parte manifesta concordância e tem sua remuneração acertada no contrato, o STJ considerou ser válida a cláusula. Também se exige que a renúncia aos honorários sucumbenciais seja uma cláusula expressa, isto é, não pode ser pressuposta.

29 – A administração pública tem que indenizar os serviços prestados pelo contratado se for reconhecida a nulidade de contrato administrativo por falta de prévia licitação?

Irene Nohara: Sim, por proibição de enriquecimento ilícito, sobretudo quando há boa-fé do contratado. Não há dever de indenizar, todavia, se houver má-fé ou ter o contratado concorrido para a nulidade.

30 – O aumento salarial determinado por dissídio coletivo de categoria profissional pode ser considerado acontecimento previsível, devendo assim ser suportado pela empresa contratada, sem, portanto, ser necessária recomposição de valores definidos em contrato com a administração?

Irene Nohara: Sim, é decorrente de álea ordinária. Não se considera extraordinária, o que não permite a aplicação da teoria da imprevisão. Para o Superior Tribunal de Justiça, é firme o entendimento de que aumento salarial determinado por dissídio coletivo de categoria profissional é acontecimento previsível e que deve ser suportado pela contratada, não havendo como se alegar a teoria da imprevisão para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro.

CONTRATAÇÃO INTEGRADA E SEMI-INTEGRADA

O escopo da atual abordagem é enfocar as oportunidades e os riscos do uso da contratação integrada e da contratação semi-integrada em função da nova disciplina. Apesar de a Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos) ser, assim como a anterior, uma lei maximalista, curiosamente, em alguns pontos ela acabou sendo omissa ou lacônica, como é o caso da indagação sobre as hipóteses de uso da contratação integrada, em que, apesar de a lei ter definido o que é contratação integrada, faltou prever, na toada da legislação anterior compilada, com foco no RDC e também na Lei das Estatais, de forma mais específica para quais circunstâncias ela será utilizada.

A contratação integrada já havia sido prevista no âmbito da Petrobrás (anterior Decreto 2.745/1998) anteriormente à sua positivação na Lei do RDC. No entanto, foi a partir da urgência da Copa que ela começou a ser disseminada de forma mais geral, tendo em vista a aprovação da medida provisória que determinava sua utilização para os jogos mundiais e na infraestrutura dos aeroportos das capitais de Estados distantes até 350 km das cidades sedes dos jogos, sendo precedida por sucessivas edições de medidas provisórias com o escopo de ampliar sua utilização.

Na época, era até visto como ‘antipática’ a postura de criticar a ampliação do uso do regime de contratação integrada, dado que ela era propagada como um sinônimo de grande sucesso em termos de modernização nas contratações de obra.

Contudo, a forma como foi sendo imposta por medidas provisórias, que muitas vezes tomavam carona em medidas que tratavam de outros assuntos, chegou a ser analisada e criticada pelo Supremo Tribunal Federal, sendo que, na atualidade, já existem muitos casos que infelizmente amargam experiências negativas de seu uso também no Brasil, em contratações que acabaram sendo mais caras, muitas das quais foram implicadas em investigações de corrupção e também não foram entregues, como que seria de se supor, no prazo hábil para o fito de alcançar o prazo dos jogos mundiais.

Note-se também que há experiências positivas, sendo importante que se conheça bem do regime para que sua utilização seja feita de forma adequada com as potencialidades do seu uso, evitando-se as distorções possíveis de acontecer, daí porque o enfoque das oportunidades e dos riscos.

Assim, para explicar bem o que é a contratação integrada é importante pressupor que ela procura superar um limite jurídico da anterior lei. Segundo a sistemática da Lei nº 8.666/93, quem projetava não executava a contratação… Havia, portanto, uma separação pronunciada entre a fase de “projetamento” em relação à fase de “execução” de uma obra.

Logo, pela sistemática anterior ao surgimento da contratação integrada, havia necessidade de licitar, como regra geral: (1) a contratação do projeto básico, sendo que ao autor deste projeto vencedor, que iria modelar a licitação da obra, era proibido, nos termos do art. 9º da anterior lei, de participar da execução da obra decorrente deste projeto, e (2) a execução da obra, a qual era viabilizada por uma outra licitação.

A Lei nº 8.666/93 apenas permitia, conforme § 1º do art. 9º, que houvesse a participação do autor do projeto ou da empresa responsável pela elaboração do projeto na licitação da obra ou na sua execução na qualidade de consultor ou de técnico, em funções de fiscalização, supervisão ou gerenciamento, exclusivamente a serviço da Administração interessada.

Ressalte-se, outrossim, que a presença do projeto básico era obrigatória na contratação de qualquer obra ou serviço nos termos do art. 7º, § 2º, I, da Lei nº 8.666/93, segundo o qual: “as obras e os serviços somente poderão ser licitados quando: I – houver projeto básico aprovado pela autoridade competente e disponível para exame dos interessados em participar de processo licitatório”.

Atualmente, o art. 46, § 1º, da Lei nº 14.133/2021 veda a realização de obras e serviços de engenharia sem o projeto executivo, sendo, nos termos do § 2º, do mesmo artigo, que a Administração é dispensada da elaboração do projeto básico nos casos de contratação integrada.

A presença do projeto básico na anterior lei geral de licitações e contrato era exigência necessária à especificação do objeto de modo gerar mais controle em relação ao que pretendia obter o Poder Público, com delimitação de precisão, circunstância e modo de realização.

Assim, havia um modelo fechado, sem muita flexibilidade para outras soluções inovadoras, em que o projeto básico orientava a que houvesse sobretudo um controle focado em obrigações de meio. Se houvesse qualquer erro de projetamento, este seria atribuível à Administração, resguardando-se, portanto, ao particular o direito ao aditamento contratual.

A contratação integrada surgiu para subverter essa separação, gerando mais flexibilidade para inovações diante do fato de que a fase de projetamento e de execução são ambas “delegadas”, em sistemática diferenciada, para a mesma empresa. Do ponto de vista da Administração, quando há esta “delegação” a vantagem seria repassar também à empresa a responsabilidade por quaisquer erros de projetamento vivenciados no momento da execução, pois o art. 9º, IV, da Lei nº 12.462/2011 (Lei do RDC) veda expressamente a celebração de termos aditivos aos contratos firmados em regime de contratação integrada.

Trata-se de regime de contratação, veiculada pelo RDC, inspirado no EPC (Engineering, Procurement and Construction Contract), em que o epecista, como uma espécie de empreiteiro, se incumbe de projetar, executar e entregar a obra integralmente pronta, equipada e testada… Assim, funciona como um sistema conhecido como turn-key (viragem da chave), em que a obra é entregue pronta e testada em condições de funcionamento.

A diferença entre a contratação integrada e um modelo de empreitada integral nestes moldes turn key é apenas que, na contratação integrada, o particular assume também a incumbência de elaboração do projeto base.

A rápida positivação por medida provisória do RDC (Regime Diferenciado de Contratação) vinha no encalço dos jogos mundiais sediados pelo Brasil, pois se alegava urgência devido à proximidade dos eventos esportivos para que houvesse a contratação de obras supostamente mais rápidas, com possibilidade de entrega, por exemplo, de estádios e aeroportos, em plenas condições de funcionamento.

Como a contratação é feita em “um pacote todo”, sendo uma contratação, portanto, por preço global, há um foco no resultado, em modelo associado ao ideário da new public management no sentido da performance based-accountability (prestação de contas com base no resultado). Assim, existe uma flexibilização maior, com um voto de confiança, sendo a ênfase de controle deslocada dos meios e procedimentos para os resultados.

Note-se que nos Estados Unidos, no geral, existem maior liberdade às equipes de licitações para agir sem tantas amarras procedimentais para alcançar inovações nas negociações.

A ideia é que o cronograma físico seja medido por etapas, conforme a finalização. O § 2º do inciso I do art. 9º da Lei do RDC previu que o instrumento convocatório da contratação integrada deve conter anteprojeto de engenharia para a caracterização da obra ou serviço, incluindo: (a) a demonstração e a justificativa do programa de necessidades, a visão global dos investimentos e as definições quanto ao nível de serviço desejado; (b) as condições de solidez, segurança, durabilidade e prazo de entrega; (c) a estética do projeto arquitetônico; e (d) os parâmetros de adequação ao interesse público, à economia na utilização, à facilidade na execução, aos impactos ambientais e à acessibilidade.

Ademais, foi estabelecido que o valor estimado da contratação será calculado com base nos valores praticados pelo mercado, nos valores pagos pela administração pública em serviços e obras similares e na avaliação do custo global da obra, aferida mediante orçamento sintético ou metodologia expedida ou paramétrica.

Assim, a possibilidade de licitação do todo, sem o projeto básico anterior, abre possiblidade de apresentação de soluções inovadoras, supostamente mais baratas e modernas. Ao se voltar para um modelo de contratação mais global, em que a Administração recebe “todo o pacote” em condições de operação, há um foco maior, conforme dito, ao controle de resultados.

Portanto, a ideia do RDC de ‘delegação’ para a inovação é uma oportunidade de a iniciativa privada solucionar melhor a proposta. A desvantagem para o contratado é que ele terá oportunidade de modelar com mais liberdade uma futura construção de obra, mas, ao mesmo tempo, como ele fica incumbido da projetação, qualquer erro ou falha do projeto básico de sua incumbência ficam sob sua responsabilidade, o que pode ser menos seguro do que o sistema anterior, o qual dava mais margem de atribuição de erro à Administração, com a garantia da celebração de termos aditivos (aditamentos) para diversas ocorrências de execução do projeto base.

Aliás, neste ponto a matriz de riscos acaba sendo um instrumento que contribui para que haja a melhor distribuição de riscos contratais, sendo elogiável o fato de que o art. 22, § 3º, determina que quando a contratação se referir a obras e serviços de grande vulto ou forem adotados os regimes de contratação integrada e semi-integrada o edital obrigatoriamente contemplará matriz de alocação de riscos entre contratante e contratado.

Atualmente, a Lei nº 14.133/2021 previu no art. 6º, XXXII, a seguinte definição da contratação integrada: regime de contratação de obras e serviços de engenharia em que o contratado é responsável por elaborar e desenvolver os projetos básicos e executivo, executar obras e serviços de engenharia, fornecer bens ou prestar serviços especiais e realizar montagem, teste, pré-operação e demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto.

Note-se que apesar da delegação do projeto básico, a lei determina que haja a elaboração de um anteprojeto.

Do ponto de vista de oportunidade, imaginando um cenário ideal, a contratação integrada é capaz de gerar contratações mais baratas ou mesmo com soluções técnicas superiores, pois as empresas que conhecem mais de perto a estrutura de mercado na qual atuam, podem oferecer propostas com metodologias melhores e vencer a licitação, tendo mais margem para embutir também sua lucratividade. Do ponto de vista da Administração, o fato de a empresa elaborar o projeto significa que os riscos de ocorrências de projetamento acabam sendo repassados ao contratado.

Assim, o licitante pode estudar propostas inovadoras de domínio mais restrito, inserindo sua lucratividade nisto, pois ele terá mais liberdade para modelar a futura contratação, e ainda gerar inovação, que é um dos objetivos novos estabelecidos no art. 11 da Lei nº 14.133/2021, na forma de solucionar as necessidades de contratação da Administração.

Ele assume um pacote de tarefas e também os riscos da modelagem da obra, pois tanto na contratação integrada, como na semi-integrada, conforme se verifica do teor do art. 133 da Lei nº 14.133/2021, é vedada alteração de valores contratuais, exceto para os casos de caso fortuito ou força maior; alterações determinadas pela Administração, desde que nos limites; necessidade de alterações do projeto em contratação semi-integrada, que faz parte da dinâmica deste regime; e evento superveniente alocado na matriz de risco de responsabilidade da Administração.

Aliás, o art. 22, § 3º, da Lei nº 14.133/2021 prevê a obrigatoriedade tanto na contratação integrada, como na semi-integrada, que o edital contemple matriz de alocação de riscos entre contratante e contratado.

Houve um tempo em que o parcelamento da licitação era a tônica central. Ainda existe na nova lei a previsão do princípio do parcelamento, mas, como as estruturas de mercado variam e o Poder Público acaba sendo sensível também a esta variabilidade para o aprimoramento de suas contratações, hoje a tendência é o do “pacotão” para as contratações, no geral. Uma prova disto é que os próprios órgãos de controle, não obstante respeitarem a padronização, também estão atentos a abrir brecha justificada para as vantagens da contratação de facilities em contratos nos quais há a reunião de uma série de serviços: conservação, limpeza, apoio administrativo, manutenções pequenas, o que permite a partir da concentração uma diminuição de custos, por exemplo, em contratações de gestão de condomínios, em que manter cada serviço isoladamente pode sair, a depender da circunstância, mais caro.

Mutatis mutandi, essa ideia de concentração está presente na contratação integrada, que se volta a obras e serviços de engenharia, pois há a concentração de escopos para prestações, com ganhos de economia a preços competitivos.

Contudo, conforme dito, como o foco se desloca da verificação e controle de itens unitários ou de quantidades unitárias para o alcance de resultados por preços globais e etapas de cumprimento de metas (performance based accountability), com a delegação da elaboração do projeto básico para a iniciativa privada, há uma flexibilização do controle dos meios, sendo condicionada à vedação de celebração de aditivos.

Esse sistema apresenta oportunidades e riscos. Oportunidade ao Poder Público de receber uma contratação com metodologias inovadoras, sendo repassados ao particular inúmeros riscos na execução, derivados do fato dele ter se comprometido com o projetamento. Contudo, do ponto de vista dos riscos no tocante ao controle, é importante advertir que a falta de um projeto básico prévio tem o potencial de propiciar futuras dificuldades de dimensionamento dos custos envolvidos na contratação, tornando, portanto, mais obscura a identificação de preços, o que a depender da índole daquela contratação pode gerar mais dificuldades na identificação de sobrepreços.

Ora, do ponto de vista mais profundo, não há soluções mágicas para os problemas. Cada solução apontada tem novos problemas, são “solublemas”, pois resolvem um ponto, mas criam novos gargalos.

Assim, o controle item a item, dentro da dinâmica tradicional do projeto básico sendo ofertado pela Administração, tem a possível desvantagem do aumento da burocracia, talvez de uma maior morosidade, deixava o particular mais amarrado no que é exigido, mas mais acomodado com a possibilidade dos aditivos, o que resguardava de forma mais segura sua lucratividade conforme previsões iniciais.

Já o sistema de delegação do projetamento permite com que haja mais disputas por soluções efetivamente mais econômicas, pois o mercado se mobiliza para procurar inovações, mas, ao mesmo tempo, ao levar o pacote todo com promessas de resultados, os particulares criativos aumentam suas chances de disputa caso apresentem alguma inovação mais vantajosa técnica e economicamente, mas se vinculam ao que prometem, sem chance de jogar para a conta do Poder Público os incidentes diferentes do por eles projetado, sendo, ainda, diminuídas as oportunidades de controle parcelado pois o controle se debruça sobre o todo, geralmente por etapas de cumprimento ou de forma periódica, havendo mais “oportunidades” (risco), portanto, de se ‘maquiar’ sobrepreços, pela flexibilização ofertada pelo regime, em jogos de planilhas (risco de fraudes)…

Então, a orientação do Tribunal de Contas é no sentido de que a Administração seja diligente na formulação do anteprojeto de engenharia e cuidadosa na estimação do cálculo do valor da contratação.

O risco de ausência de cuidado é que, diante da flexibilização de controle itemizado e em face da uma elaboração lacunosa de um anteprojeto a construtora fique mais livre para ‘maquiar’ informações, hipótese em que a contratação integrada tem potencial maior de encobrir sobrepreços.

Assim, somente a pesquisa empírica, de estudo casuístico, será capaz de concluir se, em determinados casos, a contratação integrada efetivamente é mais barata e melhor do que o sistema tradicional, em que a Administração assume para si o projetamento, mas também faz um controle mais criterioso com base no planejado, pois em alguns casos a contratação integrada, apesar de ter sido idealizada para ser mais barata, pode sair mais cara e também estimular a lucratividade com a diminuição da qualidade do objeto.

Não é só para a Administração que o regime pode ter vantagens e desvantagens, pois a vantagem competitiva de apresentar uma nova medodologia por parte do particular é associada também à assunção de inúmeros riscos, conforme visto.

Por esse motivo, a contratação semi-integrada (que foi novidade da Lei das Estatais) apresenta vantagens em termos de controle em relação à integrada, sendo também acrescido o ingrediente da inovação tendo em vista o fato de que nela não há delegação do projeto básico, mas apenas do projeto executivo, mas o ingrediente de inovação reside na possibilidade de a empresa alterar o projeto básico para melhor customizá-lo às necessidades da Administração. Então, ela não abre para a empresa confeccionar todo o projeto básico, mas, ao mesmo tempo, não o fecha o projeto a ponto de ser imutável, o que estimula, então, a que haja propostas de metodologias inovadoras ou de domínio restrito do mercado.

A contratação semi-integrada é definida no inciso XXXIII do artigo 6º da Lei nº 14.133/2021 de maneira muito similar à contratação integrada, com a ressalva, no entanto, de que o contratado é responsável por elaborar e desenvolver o projeto executivo. Por conseguinte, o projeto executivo acaba sendo elaborado com fundamento em projeto básico já existente quando da licitação, mas que não é imutável, e, neste ponto, se abre a oportunidade de inovação.

Essa dinâmica contratual acaba tendo potencial de oferecer vantagens à Administração, pois ela parte do projeto básico, mas a possibilidade da alteração do projeto básico, por sua vez, abre a chance de o Poder Público receber soluções técnicas inovadoras, com metodologias diferenciadas ou de domínio restrito, que indiquem vantagens, sendo ainda vantajoso para o Estado se ele aceitar adaptar o projeto básico, com base em proposta apresentada pela empresa (que no sistema de licitação tradicional, era mais fechado), pois a obrigação de meio da empresa se transforma praticamente em uma obrigação de resultado, sendo que, nesta proposta apresentada pelo particular, se houver erro, o contratado avoca (chama para si) os riscos do erro decorrente desta alteração de projetamento.

Em síntese, o particular assume, então, a responsabilidade integral pelos riscos associados à alteração do projeto básico, havendo uma delegação de riscos neste tocante. Tendo em vista estas vantagens apontadas, a Lei das Estatais, que foi pioneira em positivar a contratação semi-integrada, determinou ser preferencial a adoção deste regime em relação aos demais, sendo que a adoção dos demais regimes deve realizada de forma justificada, conforme se percebe do teor do art. 42, § 4º, da Lei nº 13.303/2021.

Percebe-se que a vantagem da contratação semi-integrada é a possibilidade de ampliar a disputa na licitação a partir da potencialidade de alteração da solução apresentada no projeto básico, daí, em tese, ganha quem apresentar a ‘melhor solução’, sendo importante a motivação dos atos da comissão em relação à efetividade desta vantajosidade, conforme determina a LINDB, que agora é incorporada no bojo da Nova Lei de Licitações, de acordo com o art. 5º. Assim, a contratação semi-interada é capaz de resultar em inovações superiores ao antevisto no projeto básico, sem que haja delegação do projetamento.

São fatores que são levados em consideração para alteração do projeto básico na contratação semi-integrada, conforme § 5º do art. 46 da Lei nº 14.133/2021:

  • redução de custos;
  • aumento de qualidade;
  • redução do prazo de execução; ou
  • facilidade de manutenção ou operação.

No caso da redução de custos, trata-se de um elemento que deve ser apreciado com cuidado e com expertise, pois ele tem potencial, se mal estruturado, de diminuir a qualidade da contratação. Então, sempre importante observar a qualidade técnica da solução de adaptação do projeto básico sugerida.

Por esse motivo que não se pode de plano celebrar a ampliação do uso do regime, pois muitas Administrações acham o regime vantajoso, mas para o fito de simplesmente de delegar para a iniciativa privada o projetamento. Contudo, se há uma assimetria muito grande de informações, no tocante ao estado da arte das metodologias, também a Administração poderá cair no “conto do vigário” de determinado licitante pressupondo que a sua solução é qualitativamente superior, mas que no fundo representa um risco pela redução da qualidade da obra ou do serviço de engenharia.

Para essas circunstâncias, deve-se elogiar o fato de a lei nova (Lei nº 14.133/2021) ter previsto no art. 8º, § 4º, que em licitação que envolva bens ou serviços especiais cujo objeto não seja rotineiramente contratado pela Administração, poderá ser contratado, por prazo determinado, serviço de empresa ou de profissional especializado para assessorar agentes públicos responsáveis pela condução da licitação, para tentar reequilibrar o estado da arte e evitar que a Administração seja ludibriada por soluções técnicas que não agreguem vantagens técnicas e que, portanto, reduzam a qualidade da obra ou do serviço.

Um ponto que específico em que houve alteração da disciplina da contratação semi-integrada na Lei das Estatais em relação à Nova Lei de Licitações e Contratos foi o prazo. Assim, na Lei das Estatais o prazo de apresentação de proposta da contratação integrada é similar ao da contratação semi-integrada, sendo correspondente a 45 dias úteis, ao passo que a Lei nº 14.133/2021 prevê prazos distintos, sendo de 35 dias úteis para a contratação integrada, em contraponto a 60 dias úteis na semi-integrada.

Também houve o veto em relação ao dispositivo do projeto aprovado que exigia o limite de valor na celebração de contratação integrada e semi-integrada a 10 milhões de reais, que tomava por base o valor de contratação de parceria público-privada (PPP).

Por conseguinte, não há limite valorativo para adoção do regime. Quanto à justificativa do veto, houve a alegação de que a fixação de um patamar mínimo de valor em 10 milhões “contraria o interesse público na medida que restringe a utilização dos regimes de contratação integrada e semi-integrada para obras, serviços e fornecimentos de pequeno e médio valor, em prejuízo à eficiência na Administração, além do potencial aumento de custos com a realização de posteriores aditivos contratuais”.

Apesar do estímulo à disseminação do uso, com a ausência de limitação de valor, o ponto que causou maior perplexidade na nova disciplina foi, conforme dito logo no início, a ausência de previsão das hipóteses de uso da contratação integrada.

Trata-se de omissão que causa estranhamento, pois o art. 9º, caput, da Lei do RDC estabeleceu hipóteses de utilização de contratação integrada para circunstâncias técnica e economicamente justificadas, sendo exigido que o objeto envolva, pelo menos, uma das seguintes condições: inovação tecnológica ou técnica; metodologia diferente de execução; e acesso a tecnologias de domínio restrito do mercado. Também o art. 43, VI, da Lei nº 13.303/2016 (Lei das Estatais) a utiliza para objeto de natureza predominantemente intelectual ou inovação tecnológica do objeto licitado, execução com diferentes metodologias ou tecnologias de domínio restrito do mercado.

Mesmo com essa lacuna perigosa, para que não haja a disseminação irrestrita da adoção do regime de contratação integrada, é importante haja a sua utilização para as hipóteses recomendadas. Assim, deve haver uma justificativa técnica e econômica de sua utilização, conforme orientação inicial do Tribunal de Contas (que foi acoplada posteriormente, em 2014, à lei do RDC, sendo esta última de 2011), não sendo, portanto, recomendável que a Administração simplesmente se utilize do regime de contratação integrada para “se ver livre” do encargo de elaboração do projeto básico.

Nesta perspectiva, há o Acórdão 2.075/2018 do TCU no sentido de que se a metodologia já é conhecida, isto é, não se trata de indagação de domínio restrito ou desconhecido da Administração, é recomendável que ela licite o projeto básico ou faça uma contratação semi-integrada, em vez de ‘delegar’ para a empresa a elaboração do projeto básico.

Em suma, deve-se frisar que a vantagem da contratação integrada é acoplar inovação e não simplesmente repassar o encargo de projetamento ao particular. Apesar da surpreendente lacuna legal, com a ausência dos pressupostos correntes de utilização da contratação integrada, é importante que o horizonte de inovação, da execução com diferentes metodologias ou com tecnologias de domínio restrito não seja perdido de vista, sob pena da banalização do regime gerar futuramente problemas.

Neste sentido, o planejamento e o projetamento são centrais às boas licitações, pois como se diz no senso comum: pau que nasce torto não se endireita…

Portanto, não pode a Administração partir de um pressuposto de falta de recursos humanos para projetamento ou mesmo de recursos materiais para licitação do projeto básico como simples justificativa para realização de uma contratação integrada, pois, para que haja o correto dimensionamento e controle posterior, ao menos deve haver um anteprojeto de qualidade e também o desenho adequado da necessidade da Administração, pois a possibilidade de descontrole poderá ser futuramente prejudicial à qualidade da obra e também à identificação e combate às fraudes.

De acordo com o § 3º do art. 46 da Lei nº 14.133/2021, na contratação integrada, após a elaboração do projeto básico pelo contratado, o conjunto de desenhos, especificações, memoriais e cronograma físico-financeiro deverá ser submetido à aprovação da Administração.

A Administração terá, portanto, de ter expertise para aprovar o projeto básico que for oferecido pela empresa, sendo importante que não caia na sedução da redução da qualidade do objeto a pretexto de inovação. Assim, ela deve, conforme obrigação legal, ter aptidão para avaliar sua adequação em relação aos parâmetros definidos no edital e conformidade com as normas técnicas, vedadas alterações que reduzam a qualidade ou a vida útil do empreendimento.

Infelizmente com o sucateamento das condições ofertadas pelo Poder Público de permanência em muitos âmbitos dos melhores cérebros na área da engenharia a tendência é aumento da assimetria de informações entre Estado e Mercado. Percebe-se uma tendência neste sentido até pelo fato do trâmite da PEC 32/2020… que não busca valorizar as carreiras e ampliar os concursos, condição para atrair profissionais de alta performance…

Houve um tempo em o Poder Público realizava em profusão e excelentes condições concursos para atrair e valorizar engenheiros. Assim, grandes engenheiros almejavam construir carreira pública, tendo em vista a sua valorização, com bons planos de carreira, perspectivas de aposentadoria e incentivos, seja nas estatais ou no Poder Público, assim, o Estado já contava com uma mão de obra apta a bem avaliar de forma acurada os critérios técnicos dos projetos…

Atualmente, percebe-se que a Administração Pública federal ainda tem condições de atrair e manter excelentes profissionais, mas os Estados e sobretudo as Municipalidades são desafiadas pelas metas de corte, que redundam em perdas materiais e humanas…

Contudo, reitere-se que a contratação integrada não pode ser vista como pretexto para justificar falta de recursos necessários à estruturação do projeto, pois o anteprojeto deve ser adequado, sob pena de poder gerar obras sem a inovação em termos de qualidade. Ademais, conforme dito, se a Administração sabe qual a solução de projetamento, não é o caso da utilização da contratação integrada, pois ela este regime é recomendável para fomentar soluções técnicas inovadoras quando há assimetria de informações entre o Poder Público e o estado da arte de determinada prestação pela iniciativa privada.

Outra novidade prevista na nova lei foi a possibilidade de delegação dos processos de desapropriação feitos em nome da Administração. De acordo com o art. 46, § 4º, da Lei nº 14.133/2021, nos regimes de contratação integrada e semi-integrada, o edital e o contrato, sempre que for o caso, deverão prever as providências necessárias para a efetivação de desapropriação autorizada pelo poder público.

Enfim, há a necessidade de se calibrar o uso da contratação integrada para não resultar em sobrepreços na delegação feita à empresa, hipótese em que ela pode ficar mais cara e não oferecer solução melhor do ponto de vista técnico e econômico. Conforme exposto, a contratação semi-integrada, por sua vez, apresenta a vantagem de não delegar a sistemática de licitação, pois parte de projeto básico já existente, mas também não é inflexível em relação às soluções técnicas inovadoras, as quais poderão justificar uma mudança no projeto básico, hipótese em que a empresa assume os riscos da proposta ofertada.

Em suma, como a lei é recente, fica aberto aos órgãos de controle determinar se a jurisprudência anterior será também replicada na interpretação da nova lei ou se, diante da peculiar disciplina, haverá a delimitação de nova jurisprudência sobre o assunto. Entendo importante neste caso aproveitar o que existe anteriormente em termos jurisprudenciais (dos Tribunais de Contas) para que não haja abusos na utilização dos regimes e que para que eles sejam utilizados em hipóteses ajustadas para seus intrínsecos escopos de inovação em obras e serviços de engenharia.

Artigo escrito por Irene Patrícia Diom Nohara


Dispositivos da nova lei que disciplinam o tema das contratações integradas e semi-integrada:

Art. 6º Lei de Licitações e Contratos – Lei nº 14.133/2021

XXXII – contratação integrada: regime de contratação de obras e serviços de engenharia em que o contratado é responsável por

– elaborar e desenvolver os projetos básico e executivo,

executar obras e serviços de engenharia, fornecer bens ou prestar serviços especiais e realizar montagem, teste, pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto.

XXXIII – contratação semi-integrada: regime de contratação de obras e serviços de engenharia em que o contratado é responsável por

– elaborar e desenvolver o projeto executivo,

executar obras e serviços de engenharia, fornecer bens ou prestar serviços especiais e realizar montagem, teste, pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto.

Art. 22. O edital poderá contemplar matriz de alocação de riscos entre o contratante e o contratado, hipótese em que o cálculo do valor estimado da contratação poderá considerar taxa de risco compatível com o objeto da licitação e com os riscos atribuídos ao contratado, de acordo com metodologia predefinida pelo ente federativo.

§ 1º A matriz de que trata o caput deste artigo deverá promover a alocação eficiente dos riscos de cada contrato e estabelecer a responsabilidade que caiba a cada parte contratante, bem como os mecanismos que afastem a ocorrência do sinistro e mitiguem os seus efeitos, caso este ocorra durante a execução contratual.

§ 2º O contrato deverá refletir a alocação realizada pela matriz de riscos, especialmente quanto:

I – às hipóteses de alteração para o restabelecimento da equação econômico-financeira do contrato nos casos em que o sinistro seja considerado na matriz de riscos como causa de desequilíbrio não suportada pela parte que pretenda o restabelecimento;

II – à possibilidade de resolução quando o sinistro majorar excessivamente ou impedir a continuidade da execução contratual;

III – à contratação de seguros obrigatórios previamente definidos no contrato, integrado o custo de contratação ao preço ofertado.

§ 3º Quando a contratação se referir a obras e serviços de grande vulto ou forem adotados os regimes de contratação integrada e semi-integrada, o edital obrigatoriamente contemplará matriz de alocação de riscos entre o contratante e o contratado.

§ 4º Nas contratações integradas ou semi-integradas, os riscos decorrentes de fatos supervenientes à contratação associados à escolha da solução de projeto básico pelo contratado deverão ser alocados como de sua responsabilidade na matriz de riscos.

Art. 23

§ 5º No processo licitatório para contratação de obras e serviços de engenharia sob os regimes de contratação integrada ou semi-integrada, o valor estimado da contratação será calculado nos termos do § 2º deste artigo, acrescido ou não de parcela referente à remuneração do risco, e, sempre que necessário e o anteprojeto o permitir, a estimativa de preço será baseada em orçamento sintético, balizado em sistema de custo definido no inciso I do § 2º deste artigo, devendo a utilização de metodologia expedita ou paramétrica e de avaliação aproximada baseada em outras contratações similares ser reservada às frações do empreendimento não suficientemente detalhadas no anteprojeto.

Obs.

§ 2º No processo licitatório para contratação de obras e serviços de engenharia, conforme regulamento, o valor estimado, acrescido do percentual de Benefícios e Despesas Indiretas (BDI) de referência e dos Encargos Sociais (ES) cabíveis, será definido por meio da utilização de parâmetros na seguinte ordem:

I – composição de custos unitários menores ou iguais à mediana do item correspondente do Sistema de Custos Referenciais de Obras (Sicro), para serviços e obras de infraestrutura de transportes, ou do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices de Construção Civil (Sinapi), para as demais obras e serviços de engenharia;

II – utilização de dados de pesquisa publicada em mídia especializada, de tabela de referência formalmente aprovada pelo Poder Executivo federal e de sítios eletrônicos especializados ou de domínio amplo, desde que contenham a data e a hora de acesso;

III – contratações similares feitas pela Administração Pública, em execução ou concluídas no período de 1 (um) ano anterior à data da pesquisa de preços, observado o índice de atualização de preços correspondente;

IV – pesquisa na base nacional de notas fiscais eletrônicas, na forma de regulamento.

Art. 46.Na execução indireta de obras e serviços de engenharia, são admitidos os seguintes regimes:

I – empreitada por preço unitário;

II – empreitada por preço global;

III – empreitada integral;

IV – contratação por tarefa;

V – contratação integrada;

VI – contratação semi-integrada;

VII – fornecimento e prestação de serviço associado.

§ 1º É vedada a realização de obras e serviços de engenharia sem projeto executivo, ressalvada a hipótese prevista no § 3º do art. 18 desta Lei.

§ 2º A Administração é dispensada da elaboração de projeto básico nos casos de contratação integrada, hipótese em que deverá ser elaborado anteprojeto de acordo com metodologia definida em ato do órgão competente, observados os requisitos estabelecidos no inciso XXIV do art. 6º desta Lei.

§ 3º Na contratação integrada, após a elaboração do projeto básico pelo contratado, o conjunto de desenhos, especificações, memoriais e cronograma físico-financeiro deverá ser submetido à aprovação da Administração, que avaliará sua adequação em relação aos parâmetros definidos no edital e conformidade com as normas técnicas, vedadas alterações que reduzam a qualidade ou a vida útil do empreendimento e mantida a responsabilidade integral do contratado pelos riscos associados ao projeto básico.

§ 4º Nos regimes de contratação integrada e semi-integrada, o edital e o contrato, sempre que for o caso, deverão prever as providências necessárias para a efetivação de desapropriação autorizada pelo poder público, bem como:

I – o responsável por cada fase do procedimento expropriatório;

II – a responsabilidade pelo pagamento das indenizações devidas;

III – a estimativa do valor a ser pago a título de indenização pelos bens expropriados, inclusive de custos correlatos;

IV – a distribuição objetiva de riscos entre as partes, incluído o risco pela diferença entre o custo da desapropriação e a estimativa de valor e pelos eventuais danos e prejuízos ocasionados por atraso na disponibilização dos bens expropriados;

V – em nome de quem deverá ser promovido o registro de imissão provisória na posse e o registro de propriedade dos bens a serem desapropriados.

§ 5º Na contratação semi-integrada, mediante prévia autorização da Administração, o projeto básico poderá ser alterado, desde que demonstrada a superioridade das inovações propostas pelo contratado em termos de redução de custos, de aumento da qualidade, de redução do prazo de execução ou de facilidade de manutenção ou operação, assumindo o contratado a responsabilidade integral pelos riscos associados à alteração do projeto básico.

§ 6º A execução de cada etapa será obrigatoriamente precedida da conclusão e da aprovação, pela autoridade competente, dos trabalhos relativos às etapas anteriores.

§ 7º (VETADO).

§ 8º (VETADO).

§ 9º Os regimes de execução a que se referem os incisos II, III, IV, V e VI do caput deste artigo serão licitados por preço global e adotarão sistemática de medição e pagamento associada à execução de etapas do cronograma físico-financeiro vinculadas ao cumprimento de metas de resultado, vedada a adoção de sistemática de remuneração orientada por preços unitários ou referenciada pela execução de quantidades de itens unitários.

Art. 56

§ 5º Nas licitações de obras ou serviços de engenharia, após o julgamento, o licitante vencedor deverá reelaborar e apresentar à Administração, por meio eletrônico, as planilhas com indicação dos quantitativos e dos custos unitários, bem como com detalhamento das Bonificações e Despesas Indiretas (BDI) e dos Encargos Sociais (ES), com os respectivos valores adequados ao valor final da proposta vencedora, admitida a utilização dos preços unitários, no caso de empreitada por preço global, empreitada integral, contratação semi-integrada e contratação integrada, exclusivamente para eventuais adequações indispensáveis no cronograma físico-financeiro e para balizar excepcional aditamento posterior do contrato.

Art. 133.Nas hipóteses em que for adotada a contratação integrada ou semi-integrada, é vedada a alteração dos valores contratuais, exceto nos seguintes casos:

I – para restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro decorrente de caso fortuito ou força maior;

II – por necessidade de alteração do projeto ou das especificações para melhor adequação técnica aos objetivos da contratação, a pedido da Administração, desde que não decorrente de erros ou omissões por parte do contratado, observados os limites estabelecidos no art. 125 desta Lei;

III – por necessidade de alteração do projeto nas contratações semi-integradas, nos termos do § 5º do art. 46 desta Lei;

IV – por ocorrência de evento superveniente alocado na matriz de riscos como de responsabilidade da Administração.

Tinha sido vetado, mas o veto foi derrubado, que:

Art. 115

§ 4º Nas contratações de obras e serviços de engenharia, sempre que a responsabilidade pelo licenciamento ambiental for da Administração, a manifestação prévia ou licença prévia, quando cabíveis, deverão ser obtidas antes da divulgação do edital. A alegação do veto derrubado era no sentido de que a hipótese restringiria o uso da contratação integrada: pois o projeto seria condição para obter a licença prévia, mas ele estaria sendo elaborado pela futura contratada. 

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